Corte Suprema também impede que profissional receba menos quando está em fila para carregar e descarregar
Nelson Bortolin
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 30 de junho, promete mexer com a vida de caminhoneiros, empresas de transporte e embarcadores. Com um placar de 8 a 3, os ministros da corte declararam 11 pontos de inconstitucionalidade na lei 13.103, aprovada em 2015, conhecida como Lei do Descanso ou Lei do Caminhoneiro.
A decisão da Suprema Corte se deu em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT), representada pelo advogado Felipe Buaiz.
Em resumo, quando a decisão começar a vigorar (o acórdão ainda não foi publicado), os motoristas profissionais terão de descansar mais e receber mais pelas horas que ficam parados em filas para carregar e descarregar.
Motorista tem de descansar 11 horas ininterruptas
Embora seja chamada de Lei do Descanso ou Lei do Caminhoneiro, a 13.103 reduziu direitos da categoria previstos na 12.619, que havia sido aprovada três anos antes e acabou substituída. Antes, o motorista – seja empregado ou autônomo – tinha de descansar 11 horas ininterruptas num período de 24 horas. E mais meia hora a cada quatro horas ao volante.
Com a 13.103, as paradas obrigatórias de meia hora passaram a ser exigidas a cada seis horas ao volante. E o repouso no período de 24 horas passou a ser de oito horas ininterruptas mais três horas que podem coincidir com as paradas durante a viagem.
O Supremo decidiu que não pode. O descanso no período de 24 horas tem de ser de 11 horas seguidas.
Empregado só pode fazer duas horas extras
Na prática, a decisão inviabiliza a possibilidade de o motorista empregado fazer quatro horas extras por dia, situação que passou a ser permitida pela lei 13.103. Com as 11 horas ininterruptas e mais as pausas de meia hora, não vai sobrar tempo, num período de 24 horas, para ele fazer quatro horas extras, mas apenas duas como ocorre com os demais trabalhadores.
Tempo de espera é inconstitucional
A lei 12.619 estabeleceu que o motorista receberia pelo temo de espera para carregar e descarregar o equivalente a 1,3 vez o valor da hora normal. Já a lei 13.103 inverteu a lógica desta remuneração. E o profissional passou a ter direito a apenas 30% da hora normal quando está nas filas. O Supremo considerou que o tempo de espera é inconstitucional.
E o que vai valer? Na ADI, o advogado pediu o que os juristas chamam de efeito repristinatório, ou seja, que voltasse a valer o determinado na lei anterior (12.619). Mas o STF não concordou com esse pedido. Desta forma, não se sabe exatamente como será a remuneração do motorista pelo tempo que ele ficar na espera pela carga e descarga. Buaiz acredita que o profissional irá receber a hora normal (leia entrevista).
Não pode acumular descanso semanal
Outro ponto que o STF considerou inconstitucional e que está enfrentando resistência entre os motoristas é a possibilidade de acúmulo de descansos semanais. Ambas as leis estabelecem que, nas viagens de longa duração (mais de uma semana), a folga de ao menos um dia por semana a que todo trabalhador tem direito pode ser acumulada pelo motorista para ele usufruir quando volta para casa.
Segundo a lei13.303, o profissional pode acumular até três folgas. Ou seja, pode dirigir 21 dias diretos e depois ficar três dias descansando em sua residência.
A partir da decisão do Supremo, isso não será mais permitido. Uma vez por semana, o motorista será obrigado a folgar, esteja ele onde estiver.
Dupla de motoristas não pode descansar em movimento
Outra declaração de inconstitucionalidade dada pelo Supremo está relacionada ao trabalho em dupla na boleia. A lei 13.103 diz que o repouso do motorista que viaja com outro colega pode se dar com o veículo em movimento. Enquanto um dirige o outro descansa.
Os ministros do STF concluíram que o dispositivo é inconstitucional. Ninguém pode descansar enquanto o caminhão está em trânsito.
A permissão foi incluída pela lei 13.103 na CLT. O texto diz: “Nos casos em que o empregador adotar 2 (dois) motoristas trabalhando no mesmo veículo, o tempo de repouso poderá ser feito com o veículo em movimento…”
Lei 13.103
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